Em 1988, o Brasil respirou aliviado. Depois de anos de ditadura, uma nova Constituição, democrática e feita para o cidadão, nascia. Junto com ela, o Ministério Público (MP) ganhava um papel de destaque: defender a lei, a democracia e os direitos de todos, sem depender do governo.

Com o tempo, o MP se fortaleceu, lutando por causas importantes e combatendo a corrupção. A população reconheceu esse trabalho e o defendeu quando tentaram diminuir seus poderes por meio da famosa PEC 37.

Mas o que ninguém esperava é que, em tão pouco tempo, o MP, que deveria ser o guardião da lei, começasse a ignorar os interesses da população.

O Escândalo dos Salários e “Penduricalhos”

O que temos visto são denúncias de membros do MP (também de juízes) recebendo salários altíssimos graças aos penduricalhos que se somam aos montes. Para se der ideia do que estamos falando aqui, em 2024, mais de 35 mil pagamentos de salários a juízes superaram o valor de R$ 100 mil cada, de acordo com reportagem do Poder 360.

Mas a coisa só piora. Existe uma tal “licença compensatória por acúmulo de acervo“, que é um benefício concedido aos magistrados brasileiros com o objetivo de compensar o trabalho “extra”, para atividades além dos processos, como funções administrativas, grupos de trabalho, etc.

O argumento utilizado para isso seriam duas leis editadas em 2015, mas que trataram, apenas, da substituição mediante pagamento de gratificações a juízes federais, mas com um limite, o teto constitucional, ou seja, se o somatório desse benefício com o salário do magistrado ultrapassar o valor pago a um ministro do STF (R$ 46.366,19), uma tesoura virtual faz um corte no excedente, o que garante o cumprimento da Constituição. Contudo, ela ainda não havia sido regulamentada e por isso não havia sido colocada em prática.

No entanto, oito anos mais tarde, em 2023, sob o pretexto de regulamentar as tais gratificações, por meio da Resolução 256-CNMP, foi ampliado o objeto daquela gratificação legal, para permitir a tal licença compensatória: cada dia trabalhado nessas funções “extra”, o acervo, dá direito a folgas indenizáveis, pagas acima do teto constitucional.

E quem aprovou tudo isso? Os Conselhos Nacionais do Ministério Público e de Justiça, que deveriam fiscalizar o MP e o Judiciário para proteger o cidadão.

E a coisa se alastra!

Na sequência, os Tribunais de Contas (que fiscalizam o dinheiro público) também quiseram receber essa licença, assim como os membros do MP que trabalham nesses tribunais. Ou seja, todos os órgãos que deveriam fiscalizar estavam interessados em se beneficiar da situação.

A Justiça Falha e a Esperança se Volta à OAB

Diante disso, o Instituto OPS (esta organização da sociedade civil sem fins lucrativos que a duras penas tenta se manter de pé) entrou com uma Ação Civil Pública no STF que foi arquivada em seguida.

Se o enredo já se parecia ruim demais, eis que surge o golpe fatal.

O Ministério Público, o Judiciário e os Tribunais de Contas decidiram que não bastava receber a licença, queriam também receber todo o dinheiro retroativamente, desde 2015. Ou seja, eles querem receber de uma só vez os 8 anos de gratificação, período em que a lei não havia sido regulamentada. Isso significa que juízes, membros do MP e conselheiros dos Tribunais de Contas podem receber milhões de reais, que multiplicado pelos milhares de agentes públicos pelo país, teremos facilmente alcançado a cifra de bilhões de “dinheiros públicos”.

Diante de tudo isso, o Instituto OPS se dirigiu à OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que tem um papel fundamental na defesa da cidadania, solicitando que entrasse com ações no STF para proteger a lei e o bolso dos brasileiros já sobrecarregados de contas para pagar.

Como disse o ministro Gilmar Mendes do STF, nós brasileiros estamos diante de um “quadro de verdadeira desordem”. Sua frase se completa com a de outro ministro da suprema corte, Flávio Dino: “inaceitável vale tudo”.

Desse modo, esperamos para os próximos dias, uma resposta do Conselho Federal da OAB, no STF, em prol da Constituição, fazendo o que o MP, os Conselhos do MP, do Judiciário e os Tribunais de Contas não fizeram, que demonstram se preocuparem mais com o recebimento de milhões em penduricalhos do que na defesa dos interesses sociais, em autêntica subversão às funções para as quais foram criados.

A conta não fecha quando quem deveria nos proteger está, na verdade, nos dando as costas.

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