O Instituto OPS, por intermédio de seu diretor-presidente Lúcio Big, ajuizou ação contra a Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) para que esta seja obrigada a fornecer informações públicas que foram solicitadas com base na Lei de Acesso à Informação e sumariamente ignoradas.
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Contrariando os níveis de transparência alardeados aos quatro ventos pela ALMT, o desrespeito a essa lei federal parece ser uma prática usual quando os dados solicitados versam sobre os gastos realizados por deputados e outros servidores da casa, com a verba indenizatória.
A provável explicação para essa prática você conhecerá ao longo deste texto.
Assim como ocorre na maioria das grandes casas legislativas do país, parlamentares têm a prerrogativa de usar essa verba pública para, exclusivamente, custear despesas de mandato. Entretanto, diferentemente das outros parlamentos do país, na assembleia de Mato Grosso o parlamentar não precisa prestar contas dos gastos que sempre chegam ao teto mensal, R$ 65 mil – o maior do país.
E tem mais. Essa benesse não alcança apenas os parlamentares. Secretários do poder legislativo, consultores técnicos-jurídicos da mesa diretora, consultores legislativos em cargos de coordenação, ouvidor-geral, auditor-geral, procurador-geral e até superintendentes são agraciados com a verba, ainda que em valores menores que os recebidos pelos mandatários da Casa.
Para ter acesso à verba, o beneficiado precisa apenas preencher um memorando e aguardar por algumas horas para que todo o valor solicitado caia na conta. Simples assim!
Verba indenizatória na teoria
Criada para ajudar nas despesas de mandato, a verba indenizatória é prevista em todas as assembleias legislativas do país, na Câmara dos Deputados e no Senado. Outros órgãos também se valem dessa verba.
Para usá-la é bem simples. O parlamentar faz a despesa, pega a nota fiscal ou recibo, a depender do tipo de despesa, entrega esse documento na direção da Casa e assina um termo de responsabilidade. O ressarcimento das despesas é realizado logo após uma rápida e superficial análise contábil e fiscal é feita.
Na ALMT é diferente
Como se estivessem acima das leis, parlamentares da Assembleia Legislativa de Mato Grosso recebem o mais alto valor mensal das verbas indenizatórias pagas no país sem precisar, para isso, apresentar qualquer nota fiscal ou recibo para ter acesso a toda a grana.
É um verdadeiro festival de negligências e de desmandos protagonizado por nada menos que os responsáveis por criar e modificar leis do estado mato-grossense.
Briga antiga
Desde 2015 o Instituto OPS vem tentando obter informações sobre como é utilizada a verba indenizatória, mas sem resultados importantes. Na verdade, jamais houve qualquer fornecimento de informações acerca do assunto que não tenham sido respostas vazias, ou mesmo, o mais absoluto silêncio.
Em 2019, o procurador da ALMT enviou um relatório ao Instituto OPS dizendo, de forma resumida, que a assembleia pagou, paga e pagará a verba indenizatória a todos que ela alcança na casa e que jamais solicitará comprovação de despesas. Disse ainda que qualquer informação pormenorizada deverá ser solicitada diretamente aos gabinetes dos parlamentares, o que é um absurdo, visto que a responsável pela transparência e fornecimento de informações é a entidade ALMT.
Desde então, o Instituto OPS recorreu ao Ministério Público de Mato Grosso, Tribunal de Contas e Ministério Público de Contas de Mato Grosso, e até à OAB, sem obter qualquer sinal de que a lei seria respeitada pela ALMT.
Vale ressaltar que 6 dos 9 cargos de conselheiro dos tribunais de contas estaduais são, em maioria, ocupados por ex-deputados(as) indicados ao cargo por seus pares.
Por que tanto empenho em esconder informações?
O ex-deputado José Geraldo Riva, que presidiu a ALMT seguidas vezes, foi preso em fevereiro de 2015 sob a acusação de desvio de mais de R$ 60 milhões da assembleia. Este, porém, seria apenas um dos mais de cem processos que constavam o seu nome como responsável, sendo acusado pelos crimes de organização criminosa e desvio de dinheiro público.
Ele já havia sido afastado da presidência dois anos antes sob a acusação de desviar dinheiro dos cofres da assembleia. Em um dos processos, Riva é acusado de pagar a uma empresa fantasma quase R$ 3 milhões.
Em fevereiro de 2020 foi homologada a delação premiada de Riva que já se encontrava preso e condenado a 26 anos de prisão. Na delação ele detalhou como funcionou o esquema investigado na Operação Metástase, que apurou um desvio de R$ 2 milhões dos cofres da ALMT por meio de verbas, dentre elas a indenizatória.
De acordo com o ex-parlamentar, após o cumprimento de mandados de busca e apreensão contra ele em 2015, alguns servidores se movimentaram para retirar e destruir parte dos documentos que incriminariam a quadrilha.
Nesta época, Riva já não era parlamentar e o presidente da Casa era Guilherme Maluf, atual Conselheiro e Corregedor-geral do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Complemento de salário
Na delação, Riva disse que a verba indenizatória de R$ 65 mil serve de complemento salarial dos parlamentares. Disse ele:
“Mas esse fato não ocorria apenas em meu gabinete. Na mesma proporção na primeira-secretaria e em proporção menor nos gabinetes dos deputados que recebiam também o suprimento de fundo, e por força de uma lei passaram também a receber uma verba indenizatória. E que essa, sim, era mais utilizada como um complemento salarial do que propriamente uma despesa que era realizada e precisava ser ressarcida”.
Mais do mesmo
Apesar da delação e do escancaramento dos esquemas de corrupção envolvendo dinheiro público, a ALMT mantém inalterados os repasses da verba indenizatória aos deputados e demais cargos agraciados pela benesse.
A Justiça
Não há qualquer informação detalhada sobre os gastos envolvendo a verba indenizatória, nem mesmo solicitando via Lei de Acesso à Informação, ainda que solicitada de forma clara e precisa.
A nefasta prática contradiz tudo o que se espera de uma casa legislativa que só existe para representar o povo e por ele trabalhar incansavelmente, buscando sempre defender os interesses dos cidadãos de forma clara e transparente.
Para tentar entender toda essa opacidade da ALMT, o Instituto OPS solicitou cópia dos documentos comprobatórios de despesas custeadas pela verba indenizatória dos parlamentares e demais servidores da ALMT alcançados por este benefício, do período de janeiro de 2022 até o mais recente.
Diferentemente dos demais pedidos já realizados pela entidade, desta vez se pediu os “documentos comprobatórios”, sejam eles quais forem, pois é sabido que não existem notas fiscais para justificar os repasses aos deputados.
Deve haver ao menos um bilhetinho informando como foi gasto o dinheiro do contribuinte.
Mesmo assim, o silêncio da ALMT segue por mais de cem dias, desde que foi protocolizado o pedido de informação em 10 de maio de 2023.
Diante do descaso absoluto da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, o Instituto OPS se viu obrigado a solicitar à Justiça que a Lei Nº 12.527/2011 – Lei de Acesso à Informação – seja simplesmente respeitada.
O instituto espera que, diferentemente da postura adotada anteriormente pelo TCE, MP e MPC, o poder Judiciário faça valer o seu peso e obrigue a assembleia mato-grossense a fornecer as informações solicitadas.
Para quem quiser acompanhar, seguem os dados da ação:
JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA DE CUIABÁ
Número do processo: 1048954-74.2023.8.11.0001






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