Com verba pública, senadores chegam a abastecer veículos 52 vezes em um dia

Onze senadores terão despesas de abastecimento de veículos questionadas pelo TCU, Ministério Público e pelo próprio Senado em razão de denúncias que serão formuladas pelo Instituto OPS nos próximos dias.



Relatório elaborado a partir do levantamento organizado pelo Instituto OPS, que contou com a participação de dezenas de cidadãos de vários estados, mostrou que senadores estão sendo ressarcidos com verba pública por despesas que destoam da realidade, além de muitos outros que nem mesmo poderiam ser bancados pelo Senado por contrariarem regras próprias da Casa.

Foram encontrados dezenas de abastecimentos feitos em um mesmo dia, outros em nome do dono do posto de combustíveis, além de vários que nem mesmo é possível saber quem foi o consumidor agraciado com o dinheiro do contribuinte, pois não há qualquer informação na nota sobre quem abasteceu.

Os casos se assemelham aos já encontrados na Câmara dos Deputados em etapa anterior da Operação Tanque Furado e que foram amplamente divulgados pela mídia. Como primeiros resultados, deputados devolveram R$ 34 mil aos cofres públicos e regras internas deverão ser alteradas para coibir que outros estranhos abastecimentos ocorram.

Sem fiscalização

Por estranho que possa parecer, o Senado não pode verificar a legalidade fiscal e contábil das notas fiscais ressarcidas aos parlamentares, sendo esta uma tarefa exclusiva deles mesmos.

O Ato do Primeiro-secretário Nº 5/2014, conjunto de regras que norteiam a utilização da verba indenizatória dos senadores, em seu Art. 5º §2º diz que o “exame da documentação apresentada restringe-se exclusivamente à verificação quanto à conformidade da despesa face ao previsto no artigo 3º deste Ato (relaciona quais despesas são reembolsáveis [grifo nosso]), não compreendendo qualquer avaliação quanto à observância de normas eleitorais, tipicidade ou ilicitude.”

É o gastador do dinheiro público sendo o seu próprio fiscal.

Alguns casos que mereceram destaque

O senador Humberto Costa (PT-PE) conseguiu a proeza de abastecer 52 vezes em um mesmo instante. Os abastecimentos com GNV ocorreram em outubro de 2018 e só foram lançados em janeiro de 2020, o que já é uma irregularidade perante a legislação tributária, dado o lapso temporal, assim como ao Senado, que só admite ressarcir despesas do ano anterior até o final de março do ano seguinte.

Na NFC-e abaixo ainda é possível ver abastecimento no valor de R$ 0,02 (dois centavos), além de mais uma estranheza, a falta da identificação do consumidor na NFC-e, o que, neste caso, pode ser qualquer um.

O senador Sérgio Petecão (PSD-AC) foi ressarcido por despesas lançadas no CPF do dono do posto onde ocorreram os abastecimentos. Vale lembrar que a utilização da verba indenizatória dos senadores só pode ocorrer em nome do parlamentar ou de seus servidores de gabinete, desde que para uso exclusivo do mandato.

Nessa mesma nota fiscal, Petecão quase igualou a marca de seu colega Humberto Costa ao abastecer 50 vezes em um dia, porém com gasolina. O consumidor, no entanto, ninguém saberá dizer, pois não há qualquer identificação na NFC-e.

O senador Chico Rodrigues (DEM-RR) foi ressarcido por diversas notas fiscais que constam diesel S500, utilizado somente em veículos utilitários fabricados antes de 2012 e, em grande escala, em caminhões, ônibus e máquinas agrícolas. Em 2020, o veículo utilizado pelo senador era uma Pick-Up S10 ano 2019 que só pode ser abastecida com diesel S10.

Além disso, em quase todas as 16 notas auditadas não há incidência de documentos referenciados, prática não prevista na legislação tributária e que, desse modo, indica que ocorreram abastecimentos únicos de 200, 300 e até 400 litros de diesel comum.

Já a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) foi ressarcida por uma nota fiscal emitida em outubro de 2020 que constam 100 abastecimentos. A média de 3,3 abastecimentos por dia não é só o que chama a atenção, mas sim a quantidade de litros, ou melhor, de mililitros constantes nas NFC-e referenciadas.

O maior dos cem abastecimento foi de 1,4 litro e o menor de 110ml de gasolina. Não há qualquer identificação do consumidor, podendo ser qualquer cidadão munido de três notas de R$ 2, até de uma moeda de R$ 0,50, fato que ainda teria restado R$ 0,05 de troco.

Para além das peripécias já informadas, nas demais NFC-e que compõem as outras notas fiscais apresentadas pela parlamentar não há informação alguma de consumidor.

O que queremos

O Instituto OPS solicitará ao Ministério Público Federal que seja feita a devida apuração em cada um dos casos apresentados e a apresentação de denúncias à Justiça, tantas quanto forem necessárias, para que, no caso de se comprovar irregularidades, os fatos sejam apurados com o cuidado que merecem e que os responsáveis sejam tratados com todo o rigor da lei.

Ao Tribunal de Contas da União: a apuração de cada um dos casos apresentados, a aplicação das sanções necessárias aos envolvidos, além de sugerir ao Senado Federal profunda alteração das normas internas para o uso da verba indenizatória para fins de abastecimento e lubrificação de veículos, como a exigência para que tais despesas sejam ressarcidas aos parlamentares mediante a apresentação, exclusivamente, de NFC-e, contendo o nome do parlamentar, o modelo do veículo, placa e quilometragem do veículo na hora do abastecimento, além da manutenção do termo de responsabilidade já existente.

Ao Senado: a apuração de cada um dos casos apresentados para a cobrança, afinal e se for o caso, a cada um dos parlamentares envolvidos, de todo o valor indevidamente recebido como ressarcimento. Ademais, diante dos indícios de irregularidades, que seja autorizada uma imediata revisão de todos os ressarcimentos deferidos nos últimos anos, que se rastreiem eventuais novos casos, com semelhantes falhas, e a imediata alteração nas regras para que despesas com abastecimentos e lubrificantes sejam ressarcidas aos parlamentares mediante a apresentação, exclusivamente, de NFC-e (a exemplo do que poderá ser adotado pela Câmara Federal), contendo o nome do parlamentar, o modelo do veículo, placa e quilometragem do veículo na hora do abastecimento.

O Instituto OPS agradece a todos os envolvidos na Operação Tanque Furado e avisa que continua de olho nos gastos públicos, não apenas da Câmara dos Deputados e Senado.

2 comentários sobre “Com verba pública, senadores chegam a abastecer veículos 52 vezes em um dia

  1. ÉO BBRASIL SENDO INFELIZMENTE O BRASIL. NÃO SEI QUANDO NEM COMO ISSO VAI PARAR, PAGAMOS IMPOSTOS ABUSIVOS PARA DAR REGALIAS E VIDA MANÇA A UM BANDO DE BANDIDOS DE COLARINHO BRANCO.

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