“Contudo, não foram atendidos os critérios de risco, relevância e necessidade de atuação direta”.
Esta foi a conclusão que o Tribunal de Contas da União (TCU) chegou ao analisar os dossiês da Operação Tanque Furado elaborados pelo Instituto OPS, uma contendo dados da Câmara e outra do Senado que apontam supostas irregularidades com abastecimentos de veículos com dinheiro do contribuinte.
O valor não é pequeno e beira a um milhão de reais se consideradas as duas casas legislativas, e apenas aos dados analisados, que foram dos anos de 2019 e 2020.

Esse tipo de despesa é paga com recursos públicos da verba indenizatória desde, pelo menos, 2009 e continua até os dias de hoje.
A justificativa para o gasto é a necessidade que os parlamentares têm de se locomoverem em seus estados e em Brasília para, estritamente, exercerem seus mandatos. Seus assessores também podem usufruir da benesse.
Na atual legislatura, que se iniciou em fevereiro de 2019, a Câmara dos Deputados já ressarciu deputados em mais de R$ 51 milhões apenas com combustíveis e lubrificantes. No mesmo período, o Senado desembolsou cerca de R$ 10 milhões.
A Operação
Após auditar 1.863 notas fiscais com valores a partir de mil reais emitidas a deputados federais entre os anos de 2019 e 2020, o Instituto OPS encaminhou um dossiê ao TCU, ao Ministério Público Federal e à Câmara dos Deputados contendo situações, no mínimo bizarras, envolvendo abastecimentos de veículos de 104 parlamentares e seus assessores.
O mesmo trabalho foi realizado nas prestações de contas 11 senadores, o que resultou em outro dossiê também encaminhado aos órgãos responsáveis por analisar cada um dos casos e tomar as providências cabíveis.
O TCU emitiu os Acórdãos 1081/2022 e 1083/2022 com a decisão de apensar a outro Acórdão, ou seja, juntar os casos levantados no âmbito da Operação Tanque Furado a outros casos também encaminhados anteriormente pelo Instituto OPS.
O Acórdão que recebeu o apensamento é o TC 028.317/2016-5 que aglutinou diversas denúncias de uso suspeito da verba indenizatória por parte de deputados e senadores e que originou-se das denúncias feitas por este instituto em 2013, no âmbito da Operação Pega Safado, ainda nos tempos que se chamava apenas OPS.
Por fim, o TC 025.092/2013-8, que deu origem a este monitoramento, transferiu à investigação das irregularidades decorrentes dos expedientes “Operação Pega-Safado” e “Dossiê Dois” às casas legislativas e aos seus órgãos de controle interno, nos mesmos moldes do procedimento que havia sido adotado no Acórdão 2.426/2009-TCU-Plenário (relativa às passagens aéreas). Ressalta-se que esse TC 025.092/2013-8 é objeto de constantes solicitações de TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 028.317/2016-5 3 informações por diversas unidades do MPF, com vista à instrução de procedimentos preparatórios, notícias de fato ou inquéritos civis.
Trecho do Acórdão
Com a decisão, o TCU prossegue monitorando o uso da verba indenizatória no Senado e na Câmara sem, contudo, se aprofundar nas apurações dos mais esdrúxulos casos envolvendo o uso de dinheiro público para abastecer veículos.
Vale lembrar aqui alguns desses emblemáticos casos.
O deputado Cláudio Cajado (PP-BA) foi ressarcido integralmente e mensalmente (e ainda é), por notas fiscais que são emitidas no final do mês e que, se somada às demais, perfazem o valor exato de R$ 6 mil (valor total dessa verba), com raríssimas exceções.
Um exemplo ocorreu em setembro de 2020 quando abasteceu no 5º dia daquele mês combustível no valor de R$100,00. Na semana seguinte foram mais R$115,02, dois dias depois mais R$106,19 e R$162,00 e depois de outros dois dias lá se foram outros R$230,00.
Até aquele momento o valor gasto havia sido de R$ 713,21, restando como saldo da cota do mês, o valor de R$5.286,79. Por uma “incrível coincidência matemática”, este foi o valor da última nota fiscal apresentada pelo parlamentar, o que totalizou R$6 mil.
O Senador Humberto Costa (PT-PE) conseguiu a proeza de abastecer 52 vezes em um mesmo instante. Os abastecimentos com GNV ocorreram em outubro de 2018 e só foram lançados em janeiro de 2020, o que já é uma irregularidade perante a legislação tributária, dado o lapso temporal, assim como ao Senado, que só admite ressarcir despesas do ano anterior até o final de março do ano seguinte.
Nos chamados “cupons fiscais” ainda é possível ver abastecimento no valor de até R$0,02 (dois centavos), além de mais uma estranheza, a falta da identificação do consumidor o que, neste caso, pode ser qualquer um.
Ainda há casos em que o parlamentar abasteceu 326 vezes num só dia e outro que abasteceu mais de mil litros de diesel “numa só mangueirada”. Todos os casos foram encaminhados, além do TCU, para o Ministério Público Federal e para as próprias casas legislativas.
Até o momento, o contribuinte brasileiro viu mais de R$ 6,2 milhões de seu dinheiro ser recuperado pelo Instituto OPS que prossegue com o seu trabalho de monitorar o uso de recursos públicos em todas as esferas, do municipal ao federal.